20080916

Entidades se reúnem para planejar a coleta seletiva





Por Marcelo Frazão



Programa Acquametropole

Londrina - Quem for nesta terça-feira, 23/09, no auditório da Acil, das 11h às 12h, terá a oportunidade de ver um panorama da coleta seletiva muito diferente do apresentado oficialmente. Após registrar, pesquisar e observar as 35 Ongs - que coletam 120 toneladas de resíduos recicláveis por dia em Londrina - o ambientalista João Batista de Souza, integrante da Câmara de Resíduos Sólidos, coletou informações que sequer existem para a CMTU. Tudo será apresentado para o Consemma (Conselho Municipal do Meio Ambiente (Consemma), Acil, Sebrae, Cepeve (Central de Pesagem e Venda, que agrega 19 das Ongs), Banco do Brasil, Ministério Público. A apresentação está dentro do projeto Acquametrópole, que tem foco nos resíduos.

O cruzamento de informações coletadas, como a localização das Ongs no mapa da cidade comparadas com as áreas onde elas devem coletar, sob determinação da CMTU, - revela dados de impressionante desorganização. Os coletores de uma das Ongs, por exemplo, são obrigados a andar 10 km até o bairro onde estão os resíduos.

O ambientalista registrou ainda ongs improvisadas em ambientes de trabalho totalmente informais, irregulares e insalubres. Como mostra a comparação da coleta seletiva de Londrina com outras cidades, o cumprimento de um serviço PÚBLICO a custo quase zero perpetuou graves problemas sociais e práticas inadequadas.

Sem apoio da CMTU, a maioria das organizações trabalha de forma caótica. Coletores e separadores não têm direitos trabalhistas e previdenciários e não apresentam vínculo formal com a Prefeitura ou a CMTU. Apesar disso, são responsáveis pelo incrível resultado de 3.540 toneladas mensais de resíduos coletados - mais que toda a cidade de São Paulo. Sem remuneração pública paga aos catadores, enquanto Londrina tem despesas de US$ 21,76 por tonelada de resíduos separados, em outras cidades a coleta seletiva custa muito mais: US$ 308,82 em Ribeirão Preto, US$ 375 em Florianópolis, US $ 144 em Belo Horizonte, por exemplo. A média do custo no país é de US$ 221 por tonelada.

O reflexo dos baixos investimentos públicos na vida dos coletadores foi captado por João Batista. Há Ongs em fundos de vale, ongs que não têm galpões e separam resíduos a céu aberto, falta de métodos de organização para melhorar as linhas de separação, mulheres grávidas em atividade, inexistência absoluta de equipamentos de segurança e uma renda média de R$ 350. Muitas das Ongs estão à beira de um colapso: não há dinheiro nem mesmo para o pagamento de aluguéis de barracões, água, luz. Apenas uma das Ongs, por características muito próprias e situações que a favoreceram, consegue pagar previdência social para seus membros.

Na apresentação, o ambientalista pretende propor um novo método, organizado dentro dos princípios de uma coleta seletiva reconhecida como serviço público, de acordo com a lei federal do saneamento 11.445/07.


JORNAL DE LONDRINA 18 Set.08

Critérios para cessão dos imóveis ainda não foram definidos, segundo CMTU

Marcelo Frazão e Glória Galembeck

A Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização (CMTU) espera entregar no próximo mês 4 dos 14 barracões destinados a ONGs de separação de resíduos recicláveis, mas ainda não sabe como vai distribui-los entre as 35 organizações que trabalham no setor. Atualmente, apenas 12 ONGs recebem recursos da Prefeitura para pagar aluguéis dos locais onde estão instaladas.
Das 450 toneladas de resíduos que a cidade produz todo dia, 120 toneladas, ou 26%, são recolhidas pelos 400 trabalhadores das ONGs. Já a Visatec, empresa terceirizada, ganha R$ 150 mil mensais para levar os resíduos concentrados nos bairros pelos coletores até os barracões a única parte do sistema remunerada pela Prefeitura.

Os barracões que estão sendo construídos pela CMTU estão divididos em cinco regiões: três no Jardim Novo Horizonte (zona norte), quatro no Jardim Pioneiros (zona leste), três no Jardim Nova Conquista (zona leste), dois no Jardim Maracanã (zona oeste) e dois no Jardim Santa Cruz (zona norte). Segundo o coordenador de coleta seletiva da CMTU, Devair Almeida, os critérios para escolher quem ocupará os barracões estão sob análise. “Provavelmente será avaliado o tempo de atividade, a localização e a regularidades na documentação da ONG”, afirmou.
ultima

A Central de Pesagem e Venda (Cepeve), que agrega 19 das 35 ONGs, teme ficar de fora do processo de escolha. Há seis meses, a Cepeve encaminhou ofícios à CMTU com perguntas sobre os barracões, mas a resposta até hoje não veio. “Nunca fui consultada. Senti que, no começo, a Cepeve tinha importância e hoje não sabemos de mais nada. Não sei nem onde estão sendo construídos os barracões”, criticou a presidente da central, Sandra Araújo.
Segundo a líder, o colapso na coleta é iminente diante da falta de estrutura geral das ONGs. “A partir do mês que vem vai aumentar muito mais a quantidade de resíduos com as festas do fim de ano. E as ONGs estão em risco.”

Diagnóstico

O ambientalista João Batista de Souza realiza um diagnóstico sobre as ONGs a pedido do Conselho Municipal do Meio Ambiente (Consemma) e da Promotoria do Meio Ambiente. Segundo ele, o sistema está à beira de um colapso diante da situação de pobreza e desorganização em que vivem as entidades. “Visitei até agora 17 ONGs e estou surpreso com o estado de miséria e falta de organização”, disse.
De acordo com o ambientalista, a falta de critérios para distribuir os barracões é um dos “dilemas” para o sistema, mas há outros problemas. “Constatei ONGs onde crianças ficam no meio dos resíduos, mulheres grávidas em trabalho, sujeira, falta de água, ameaças de despejo, inexistência de equipamentos de proteção. Sem contar o problema que nunca foi resolvido: nenhum dos trabalhadores têm garantias trabalhistas ou previdenciárias”, alerta o ambientalista.

Diretor diz que vai ouvir Cepeve

O diretor da Coleta Seletiva da CMTU, Devair Almeida, garantiu à reportagem que a Cepeve será ouvida na hora de distribuir os barracões. De acordo com ele, “o momento é de retomar o diálogo” com a entidade que representa os coletores. “Quanto mais pessoas envolvidas para ajudar, melhor. Queremos tirar esse aspecto ruim que as ONGs ainda têm”, afirma. Segundo ele, hoje o sistema “está uma bagunça organizada”, mas “pode melhorar muito ainda”. “Principalmente os aspectos sociais e a segurança de quem faz o serviço.” O diretor concorda que seria ideal se os trabalhadores das ONGs fossem tratados pela CMTU como a Visatec, que recebe valores fixos pelo serviço, têm uniformes e todos os funcionários registrados com carteira assinada. “Seria bom, mas precisaríamos de um novo modelo.”








Coleta Seletiva de Londrina

Folha de Londrina

Rotina insalubre prejudica mães e filhos

Quase no sétimo mês de gestação do seu quinto filho, a recicladora Cláudia Oliveira Santos, 30 anos, passa oito horas diárias em pé separando material junto do marido, Wilson Pereira Fernandes, 23. ''No fim do dia, minhas pernas ficam inchadas e doendo'', reclama a mulher. Ao lado deles, Maria Aparecida Fernandes, 22, também não descansa. Há três meses ela deu à luz um menino e, por necessidade, teve que voltar a trabalhar 15 dias depois. Todos trabalham sem qualquer tipo de equipamento de proteção. Cláudia e Wilson se conheceram trabalhando na reciclagem. O casal e as crianças vivem numa casa de um cômodo no Jardim Monte Cristo, cedida pela irmã de Wilson. O único luxo é uma máquina de lavar, TV e som. Foi isso que conquistaram em quase uma década com reciclagem. Mas se a vida simples não incomoda, a renda de cerca de R$ 800,00 do casal ainda não permitiu que Cláudia desse o presente que mais quer para as filhas e para a criança que está prestes a nascer. ''Queria construir um quarto para as meninas'', confessa a mãe. Hoje, as crianças dormem em um colchão no chão, ao lado do fogão. Colega na reciclagem e vizinha de bairro do casal, Maria Aparecida não pára de trabalhar nem para dar entrevista. Por dia, ela separa até 125 sacos de material para garantir o sustento do filho recém-nascido que, desde os 15 dias de vida é cuidado por uma babá e não é mais alimentado com leite materno. Com apenas 22 anos, Maria é mãe de quatro crianças. (L.A.)
União dá força, mas nem tanto


Das 35 ONGs que fazem a coleta de reciclados em Londrina 19 estão representadas pela Central de Pesagem e Vendas (Cepeve), que gerencia e comercializa o material recolhido por mais de 350 trabalhadores. A união deu maior força aos grupos mas, nem por isso, os salvou da tirania do mercado. Isso faz, por exemplo, com que raríssimos trabalhadores consigam contribuir com a Previdência Social. Presidente da Cepeve, Sandra Araújo Barroso da Silva fala com incerteza sobre o futuro, principalmente por causa da lei federal que obriga que os geradores de mais de 200 kg de resíduos diários dêem a devida destinação por conta própria. Ela teme que os preços praticados sejam reduzidos por causa dos custos extras que as empresas terão. O quilo do papelão, por exemplo, já teria baixado R$ 0,04. ''Não sabemos nem se vamos conseguir chegar até o final do ano'', alerta. A atuação conjunta minimiza as adversidades, porque os recicladores atraem compradores e podem brigar por preços melhores. ''Centralizamos tudo e o comprador não gasta com transporte e tem quantidades maiores. O filiado tem um preço mínimo e sabe que todo dia 15 e dia 1º vai receber. Antes, muito comprador buscava só quando estava precisando e já tivemos até casos de calote'', compara. A Cepeve coleta pouco mais de 100 toneladas por mês. Mesmo assim, o salário de cada associado não passaria dos R$ 400,00. Cada um ainda contribui com 5% de tudo que ganha. Os recursos pagam dois prensistas, compram materiais e cobrem despesas com luz, telefone e manutenção de equipamentos. A prefeitura contribui repassando os sacos plásticos e com o transporte do material dos bairros até a Cepeve e a central de prensagem. A situação é tão crítica que, segundo Sandra, os grupos não podem abrir mão do trabalho de doentes, das grávidas e das parturientes. ''Tem associação que não aceita que sejam pagos mais do que 15 dias de licença para a mulher que deu à luz. Em caso de doença, vai da consciência do grupo e só paga se a pessoa estiver internada. Saiu do hospital hoje, amanhã já tem serviço'', lamenta a dirigente. Sandra critica que a ajuda oficial é pequena e, por isso, as boas notícias não estariam repercutindo na renda dos trabalhadores. Ela lembra que a prefeitura paga para empresas atuarem na coleta seletiva e deveria também contribuir de forma mais efetiva com as ONGs. (L.A.)


Carrinheiros levam até 300 kg no braço

Olga Leiria

‘‘Zé da Ama’’ foi atropelado e ficou mais esperto: ‘‘Tem gente que não respeita’’
Além dos mais de 500 recicladores de Londrina há ainda outros tantos que perambulam sozinhos pela cidade, enfrentando o trânsito e fuçando o lixo em busca de qualquer coisa que possa ser reaproveitada. São os chamados carrinheiros, que chegam a transportar até 300 kg de material por dia apenas com a força dos braços. ''Baiano'' de Itabaiana, no Sergipe, o aposentado José Laurentino de Matos, 67, virou carrinheiro há mais de 10 anos, logo após deixar o emprego na extinta Frente de Trabalho da Prefeitura. ''Faço carga na frente e atrás, e na descida, vou com calma porque se embalar já era'', explica. Até há algumas semanas seo ''Zé da Ama'', como é mais conhecido, não tinha medo de nada. Mas após ser atropelado ficou mais esperto com o trânsito. ''Tem gente que não respeita'', argumenta. Trabalhando 10 horas diárias, cinco dias por semana, ele consegue cerca de R$ 400 mensais. A renda complementa o salário mínimo que recebe de aposentadoria. ''Sou feliz porque, graças a Deus, tenho um trabalho.'' Feliz também é a carrinheira Lourdes Maria do Carmos, 50. Ela, que já passou fome e dormiu ao relento, fala com orgulho que o lixo reciclado deu a chance de criar os filhos com dignidade. ''A coisa que mais dói na vida é a fome, e trabalhando a gente consegue tudo nesta vida'', observa. Ela enfrenta o serviço todo santo dia junto com a filha. ''É pesado e cansativo mas compensa.'' (L.A.)


CMTU defende profissionalização

Contrária a ajudar as ONGs de recicladores injetando mais dinheiro público na coleta seletiva, a Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização (CMTU) defende que a saída é a qualificação e profissionalização. A expectativa do órgão é que mais grupos surjam, uma vez que até o final do ano a estimativa é de coletar pelo menos 150 toneladas/dia de material reciclado. O coordenador da Coleta Seletiva pela CMTU, Devair Batista de Almeida, analisa que o aumento dos grupos é irreversível. ''Gostaríamos que os carrinheiros fossem mais unidos em torno da idéia de agregar valor (ao material). Assim, teriam poder da negociação com o atravessador. Tem ONG, por exemplo, que acumula material por não ter condições de separar tudo.'' De acordo com Almeida, o município gasta hoje cerca de R$ 200 mil com a coleta seletiva - ''e estaria gastando muito mais sem eles'' - mas, nem por isso pretende interferir mais diretamente: ''A Prefeitura não pode carregar os grupos para o resto da vida, até porque se muda a administração, não há garantia nenhuma para os recicladores.'' Ele concorda que muitos grupos hoje são deficitários e aponta que enquanto alguns conseguem faturar mais de R$ 700,00 mensais outros não ganham nem a metade. Para ele, a diferença está na organização de cada ONG. A Prefeitura, segundo o coordenador, pretende entregar até julho para alguns grupos os oito primeiros barracões (de um total de 16) que estão sendo erguidos nas regiões Leste e Norte. (L.A.)